domingo, 8 de março de 2009

LittleMess



Ela era desorganizada. Seja com papéis ou sentimentos, tudo ficava sempre embolado e sem lugar. Talvez fosse de sua natureza ver tudo virando de cabeça para baixo para simplesmente se cansar e tomar uma atitude no limite do caos. Nessa linha tênue, normalmente ela organizava perfeitamente tudo. Jogava fora as coisas antigas, as águas passadas, limpava os cantos sujos, guardava as roupas fora do lugar, colocava os pensamentos em ordem. Mas era um minuto de satisfação para depois bagunçar tudo de novo, aos poucos e lentamente.


Da confusão de seu quarto, milhões de bilhetes apagados pelo tempo no quadro de recados, certificados de cursos espalhados pelas gavetas, chaves em cima da mesa para se perderem fácil, violão desafinado encostado na parede com notas e acordes soltos no ar. Ventilador ligado e cobertor revirado na cama, cd arranhado no rádio. Celular perdido no meio na confusão, toalha molhada pendurada na porta do armário e livros empoeirados na estante, desorganizados por assunto e desordem alfabética. Apesar de tudo, uma compensação: era uma pessoa criativa. E sustentada pelas reportagens que afirmam que pessoas criativas são estimuladas pela bagunça, ela bagunçava tudo com gosto. E era criativa com força.


E da confusão de sua mente, ela não sabia o que sentia, por quem sentia, quando sentia e o porquê de sentir. Ela sabia que sentia, somente. Aquilo incomodava os outros: essa confusão parecia simplesmente uma mentira ou uma fuga da realidade, só para não se aproximar de ninguém. Mas ela sabia que a verdade passava distante disso. Seu coração já tinha se curado de muita coisa e ela tinha certeza que poderia se entregar muito bem para alguém, sim senhor. O problema é que ela não sabia quem era essa pessoa. Entre algumas opções, ela pesava os prós e contras, mas nada de conclusão. Talvez por isso aquele quê de solidão que a rondava, nos piores pesadelos e nas conversas chatas de família.


Nos dias raros de arrumação geral, ela chegava aonde queria. Recebia visitas em casa e reconhecia quem era seu verdadeiro amor. Não produzia nada criativo, mas o amor e os amigos bastavam para ela e para os outros. Daí que vinha a promessa a si mesma que ia fazer aquilo mais vezes ao ano, mas eram meras palavras.


Talvez, no final das contas, ela gostasse mesmo da bagunça e da solidão. Era mais fácil.

2 comentários:

bia de barros disse...

Já encontrei pessoas muito mais solitárias e criativas que odiavam bagunça: tua personagem é, pelo menos, mais coerente nesse aspecto.

Adorable >.<

bjs,
de quem vive num meio termo entre organização e quebra de rotina...
*-*

Jaya Magalhães disse...

Te li e te imaginei. Pra mim, era você inteira nesse texto. E você, é uma linda. Trem bagunceiro mar fofo! Rs.

Flá,

Eu sou organizada. E a pessoa mais perfeccionista do mundo. E isso gera efeitos externos e internos. A organização ocorre em ambos. Agora, tem um fato: sou coração. E coração é a coisa mais desarrazoada no mundo, em sua bagunça. E quer saber? Gosto assim.

Sobre a solidão? É igual a música do hermano:

"Solidão,
foge que eu te encontro
que eu já tenho asa..."

É um constante, na vida. E é bom, por vezes.

Beijos de saudades.